quinta-feira, 15 de maio de 2014

CAIO BLINDER- Rabiscos estratégicos (Rússia & China)

Vladimir Putin tem um novo contrato social com o povo russo (e aqui falo das fronteiras formais do país e não da nação difusa que ele quer presidir na Eurásia). O triunfo nacionalista que se seguiu à anexação da Crimeia tem o previsível efeito mobilizador e fortalece a posição do Kremlin (a aprovação de Putin disparou para 90%) quando a economia enfraquece. Perde o gás a “nação de consumidores” fundada com o boom energético e que ocupou o lugar do caos e tempos enxutos dos anos 90, mas triunfa a “nação de patriotas”. A compensação é a sensação de que a Rússia será novamente uma grande potência global.
Arautos do putinismo apregoam que por este novo contrato social, os russos deram o consentimento para: criação de uma União Eurasiana (em contraponto à decadente União Europeia), a formulação de uma nova ideologia estatal corporativista (que nas minhas palavras fede a fascismo), a rejeição de reformas políticas e econômicas, crescentes gastos militares, maior distanciamento do Ocidente e uma virada para a China em um esforço para formar um eixo contra o Ocidente.
Claro que falta combinar com os chineses, prestes a superarem os EUA como a maior economia do mundo já em 2014, de acordo com alguns critérios contábeis. Sem dúvida que existem convergências econômicas entre os dois países e Putin estará em Pequim ainda neste mês para conversar com o presidente Xi Jinping. O foco do diálogo entre a ex-superpotência e a superpotência emergente será energia. Os europeus compram 75% do gás russo e querem diversificar devido à crise ucraniana. Moscou precisa cortejar novos compradores e também está em busca de capital devido à fuga de US$ 50 bilhões apenas no primeiro trimestre de 2014.
No entanto, meu bom guru, o alemão Josef Joffe (não confundir com a musa da coluna Julia Ioffe), alerta que o modelo chinês está esgotado. O pico de crescimento foi há 30 anos (15%). Caiu agora pela metade. Parte do problema é a desaceleração mundial, mas existem as razões estruturais. É um modelo que, em inglês, Joffe rotula de modernitarianism, ou modernização autoritária. Ele bateu no teto dos seus limites embutidos como aconteceu com a velha União Soviética.
Industrialização frenética sob o tacão do partido é fácil por uns tempos (o preço político é penoso, obviamente), mas a economia do conhecimento pega suas dicas do mercado e não do estado autoritário. Joffe lembra que a palavra chave é liberdade, para empreendedores, capital, ideias e inovação, além do mero exercício da cidadania.
Pactos sociais putinistas, eixos em torno de ideologia estatal corporativista e modernização autoritária não são promissores na Eurasia a longo prazo. A curto, são estas tensões na frente ucraniana e nas disputas no oceano Pacífico.

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