segunda-feira, 26 de maio de 2014

CAIO BLINDER- Rabiscos eleitorais (Parlamento Europeu)

Nas eleiç ões para o Parlamento Europeu, o establishment levou golpes à direita e à esquerda. O mais potente, é claro, foi desferido pela francesa Marine Le Pen, da Frente Nacional, líder indiscutível do sentimento xenófobo, anti-imigrante, antiEuropa, antiglobalização, em suma, anti. É um golpe sério, pois atinge o establishment da França, país no núcleo duro do projeto europeu. Especialmente frouxos, os socialistas do presidente François Hollande.
Domingo foi um voto de protesto e por este motivo não será fácil remendar a colcha de retalhos dos insatisfeitos, com sentimentos que variam do rancor à frustração. Obviamente que a extrema-esquerda grega, que também triunfou com o Syriza, não irá se aconchegar sob a mesma colcha com o Partido do Povo, da extrema direita dinamarquesa, outra que se saiu muito bem. Mesmo na extrema direita, Marine Le Pen e outro grande vencedor, o britânico Nigel Farage, do Ukip, não se bicam, não querem se acasalar apesar de inimigos comuns. E como enquadrar partidos anti-austeridade e separatistas, como na Espanha, que avançaram nas eleições, mas possuem uma clara identidade pró-Europa?
Há consolos para a velha União Europeia, como a solidez do projeto no outro integrante do núcleo duro, a Alemanha, e na caótica Itália, o Partido Democrático (de esquerda), do primeiro-ministro Mateo Renzi, se saiu melhor do que se imaginava frente ao desafio do Movimento Cinco Estrelas, do comediante anti-establishment Beppe Grilo.
Nada disso deve minimizar o impacto do estrago dos “barbarians at the gate”. Bruxelas, coração da União Europeia, a Roma do século 21, precisa reagir. A ironia é que o establishment (com partidos de direita e de esquerda) precisará trabalhar junto contra os bárbaros, acentuando a acusação de um projeto hegemônico na Europa que é elitista e burocrático. Os blocos de centro-direita (o mais forte relativamente no Parlamento Europeu) e de centro-esquerda talvez sejam forçados a formar uma “grande coalizão”, ao estilo da liderada em Berlim pela primeira-ministra conservadora Angela Merkel.
Serão necessárias mais rodadas eleitorais para se ter uma medida melhor se o voto de protesto é mais em função da crise econômica que tanto afligiu a União Europeia ou devido a algo mais profundo. No entanto, não existe muito alternativa. Contra uma Europa que sofre investidas dos bárbaros nos seus portões, mais Europa.

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